SV#127: Como dizer que um vinho é “bom” e a fórmula dos vinhos RP90+

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Como profissionais avaliam vinhos?

Como saber se um vinho é “bom”? Independente de gosto e preferências pessoais há parâmetros, definidos pela indústria e crítica, que são considerados na avaliação de um vinho para determinar se e quando um vinho é “bom”, “excepcional” ou mesmo “ruim”.

Neste episódio, revisitamos os parâmetros que definem a qualidade de um vinho e conhecemos um consultor que afirma poder predizer, com base em análises químicas, quando um vinho será considerado “muito bom” pelos principais críticos, especialmente Robert Parker. Melhor ainda, ele promete orientar produtores para obter a tão desejada pontuação, que se reflete em vendas. Será?

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Vinho do próximo episódio:

VERUM TOSCA 2014 – Espanha, Tierra de Castilla

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A química dos vinhos RP 90+

Considerado um geniozinho, Leo McCloskey percebeu que “os críticos estavam começando a controlar a cadeia de valor que ia da vinícola ao distribuidor ao varejista e ao dono do restaurante ao consumidor”. Ele diz que “Em 1990, todos estavam desacreditando o Score, mas eu vi que os críticos iriam vencer porque os americanos queriam reduzir o risco de compra e os produtores de vinho não estavam preenchendo o vazio de informações.”

E foi nisso que ele apostou. Ele afirma ser possível comprovar cientificamente, por meio de análise química, quais vinhos receberão alta pontuação. Em outras palavras, é possível atribuir valor numérico ao gosto. Mais importante: ao gosto de alguns críticos.

A empresa que ele criou, a Enologix, coleta amostras de uvas de clientes e extrai o suco para medir alguns de seus compostos químicos. Em seguida, usando o software desenvolvido pela McCloskey, a Enologix compara a química dos vinhos projetados com a de um exemplo de referência. O resultado é uma pontuação em uma escala de 100 pontos, análoga – não por coincidência – àquelas empregadas por críticos como Robert Parker do The Wine Advocate e James Laube do Wine Spectator.

Na época da reportagem mais recente que eu achei sobre a Enologix, de 2006, ele tinha, dizia ter, um banco de dados com registros de 70 mil vinhos, incluindo informações sobre solo, clima, preços, técnicas de vinificação, práticas vitivinícolas e pontuações críticas. Enquanto a ciência tradicional do vinho se concentra principalmente em produtos químicos primários – coisas como açúcar, álcool e acidez, que determinam se um vinho atende aos padrões básicos de aceitabilidade – McCloskey analisa produtos químicos secundários (como terpenos, fenóis e antocianinas), que, ao afetar mais características diferenciadas, como textura, aroma, sabor e cor, estão mais intimamente associadas à qualidade.

Ele afirma que, aplicando sua metodologia, é possível prever a pontuação do vinho com 95% de precisão +/- 2.5 pontos (a precisão cai pra 80% se estreitar o intervalo de confiança pra 1,5 pontos). Ele diz que a típica vinícola que se inscreve na Enologix percebe um aumento de cinco pontos em relação às pontuações médias dos anos anteriores para os vinhos tintos – seis para os brancos.

Os críticos ao sistema de McCloskey dizem que esse algoritmo dele é uma caixa preta, que não dá pra avaliar se funciona blablabla, mas num teste que o pessoal da Chalone Wine Group fez, todos os enólogos do grupo foram reunidos e provaram 12 vinhos e classificar por ordem de qualidade. O algoritmo da Enologix acertou os 3 melhores e os 3 piores, na ordem correta. Isso foi em 1990. Aí eles pegaram os vinhos do Château Lafite Rothschild, a famosa propriedade de Bordeaux que é um sócio no Chalone. McCloskey analisou a química das safras de Lafite da década anterior, e os resultados que ele obteve refletiram exatamente o desempenho dos vinhos. 

A Enologix divide o vinho em quatro categorias. Para os tintos, o Estilo 1 é de cor pálida e baixo teor de tanino, como a maioria dos pinot noir ou da Borgonha francesa; O estilo 2 também é pálido, mas com mais tanino, como o italiano Barolo; O estilo 3 é escuro e tânico, como muitos cabernet sauvignons e Bordeaux de primeiro crescimento; O estilo 4 é igualmente escuro, mas apenas moderadamente tânico. Esta última categoria, disse-me McCloskey, representa “a grande maioria dos vinhos emblemáticos e de sucesso, os vinhos mais elegantes e populares do mundo”.

Aí, pra fazer o vinho encaixar nesse estilo 4, ele lança mão de técnicas enológicas. A mais comum delas é o que ele chama “drain down sweet”. O que é isso: eles postergam a colheita pra concentrar a uva e produzir um sabor mais intenso, só que isso aumenta açucar tb, que aumenta o alcool. Então eles drenam doce, que seria uma tradução do drain down sweet. Drenar nesse caso é retirar o mosto, separar da casca. Interromper a maceração. Com isso ele extrai menos tanino, só os taninos mais suaves, e se faltar depois ele adiciona tanino. Tem tanino em pó pra vender. Assim, segundo o McCloskey, é possível produzir tintos no Estilo 4 – sabor rico e concentrado com sensação suave e aveludada na boca – que os críticos contemporâneos mais valorizam. e os que amam o RP também.

Já os que amam odiar o RP dizem, tudo aquilo que a gente já sabe: que os vinhos ficam todos iguais, parkerizados, que o terroir deixa de ser um ator na produção do vinho, que os vinhos são maquiados.
Segundo Randall Grahm, enólogo da Bonny Doon Vineyards os principais criticos da atualidade “não conseguem distinguir a qualidade real”, e “são facilmente enganados por essa falcatrua falsidade porque a única coisa que procuram é concentração. Isso provavelmente pode estar relacionado à química – mas eu diria que, embora possa ser um indicador de qualidade, não é o único. não fala de equilíbrio, por exemplo.” Vale ressaltar que o Graham, assim como outros críticos desse negócio todo, é um antigo favorito de Parker que caiu em desgraça.

Dica de leitura

Quem se interessar por se aprofundar nessa discussão vinho natureba x vinho que dá dinheiro pode gostar do livro An Ideal Wine: One Generation’s Pursuit of Perfection – and Profit – in California, de David Darlington (sem tradução no Brasil). O livro conta a evolução do cenário de produção do vinho na California, que passou de um sonho romântico nos anos 70, como a gente viu nas histórias dos produtores do Julgamento de Paris (aqui), pra uma industria altamente competitiva, com margens apertadas e muito mais pragmática e industrializada.

Para personificar esses 2 extremos, o YN e o YANG dos vinhos, o autor escolheu Randall Graham e o Leo McCloskey. O livro trás ainda muitas histórias, anedotas e outros personagens e bastidores da indústria. Quem quiser ler em inglês, se puder comprar usando meu link na Amazon, eu agradeço.

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